INPI prepara portaria com novas regras para registro de marca de alto renome
Por: Beatriz Olivon
Fonte: Valor Econômico
O Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) pretende alterar as
regras para registro de marcas de alto renome. O órgão prepara uma
portaria que poderá trazer critérios mais claros para a obtenção da proteção
no país. Um dos pontos tratará da pesquisa de mercado a ser apresentada
pela empresa que ajuizar o pedido, que passará a ser obrigatória.
A proteção especial, mais cara e abrangente, é adotada por quase 200 marcas
no país e reúne diferentes formatos. Há o registro de nomes como Chanel e
Flamengo, imagens como o desenho da kombi e o cavalo da Ferrari e as mistas
como o nome Rolex com a coroa e a Coca-Cola em letra cursiva.
No alto renome, a marca não pode ser utilizada por segmentos diferentes
daquele do registro original - uma proteção que não existe nos registros comuns.
“O alto renome é previsto na lei de propriedade intelectual e seria um status
especial, um reconhecimento que vai garantir a proteção daquela marca em
todas as classes de produtos e serviços”, diz Clarissa Jaegger, sócia do Montaury
Pimenta, Machado e Vieira de Mello.
A advogada explica que o custo para a obtenção do alto renome é bem superior.
O registro de uma marca custa cerca de R$ 400, acrescenta, enquanto a proteção
especial alcança R$ 38 mil, sem contar o desembolso com a pesquisa para
comprovar o alto renome ao INPI, que pode chegar a R$ 45 mil.
Hoje, a pesquisa não é obrigatória, segundo a advogada, mas os escritórios já a
contratavam porque, sem ela, não estavam conseguindo as concessões e
renovações, exigidas a cada dez anos. Esse é um dos pontos centrais na
mudança das regras previstas na Portaria INPI/PR nº 8, de 2022.
A proposta inicial do INPI, criticada por especialistas, era conceder o alto
renome apenas para quem obtivesse reconhecimento em mais de 71% das
entrevistas realizadas em pesquisa de mercado. Agora, a ideia é adotar o
percentual de 61%, desde que apresentadas provas adicionais.
De acordo com o INPI, pontos criticados por especialistas e que poderiam
dificultar esse registro serão alterados, conforme o órgão antecipou ao Valor.
O percentual inicial levava em conta a média de 71,6% dos reconhecimentos de
alto renome entre 2019 e 2023.
“Tínhamos empresas com 90% e outras muito abaixo”, diz o diretor de marcas,
desenhos industriais e indicações geográficas, Schmuell Cantanhede. Nos casos
em que o reconhecimento ficar entre 61% e 71%, segundo ele, a empresa vai
precisar apresentar provas adicionais. “Nossa perspectiva é que com 71% o alto
renome é inquestionável”, acrescenta ele, indicando que se trata de uma
simplificação, já que hoje as empresas costumam apresentar “centenas de
páginas” como prova.
A publicação desse detalhamento se insere em um movimento mais amplo do
INPI de melhoria regulatória, segundo o diretor. “Identificamos alguns
problemas que os usuários enfrentavam no reconhecimento do alto renome.
Isso se devia à falta de publicação dos parâmetros de pesquisa”, diz o diretor,
destacando ainda que muitos pedidos chegavam ao INPI com erros.
Segundo Cantanhede, algumas pesquisas de mercado acabavam descobrindo os
critérios por tentativa e erro e não porque eles eram claros. “Isso contraria os
princípios da administração pública. Por isso resolvemos dar transparência.”
A ideia de parâmetros objetivos traz previsibilidade”
— Luiza T. Coelho
A ideia também é tratar da forma como devem ser feitas as pesquisas.
Atualmente, poucos institutos fazem pesquisas de rua, como é exigido hoje pelo
INPI, segundo especialistas, e os custos nesse formato são mais elevados. Após
ouvir o mercado, o órgão decidiu que passará a aceitar, com a edição da portaria,
o formato on-line.
“O Manual de Marcas só recomenda a apresentação de pesquisas de opinião,
deixando a cargo do requerente a definição da melhor forma de comprovar a
notoriedade”, afirma Franklin Gomes, sócio da FG Propriedade Intelectual.
Para o advogado, a exigência de pesquisas de opinião com metodologia rigorosa
e abrangência nacional cria obstáculos adicionais, inclusive financeiros.
Segundo Gomes, pelas regras atuais, as marcas conseguem obter o
reconhecimento mesmo com índices de lembrança abaixo da maioria, desde
que demonstrem prestígio consolidado e abrangência nacional.
Para Daniel Marques, diretor executivo da Associação Brasileira de Lawtechs e
Legaltechs (AB2L), o INPI deveria impulsionar o aumento de patentes no
Brasil e não dificultar. “Um dos indicadores de que o país caminha para maior
desenvolvimento tecnológico é justamente o aumento de registro de patentes e
pesquisas”, diz.
Justamente para não diminuir ou relativizar o princípio da especialização das
marcas existem parâmetros rigorosos para que seja reconhecido pelo INPI o
alto renome, pondera Luiza Tângari Coelho, sócia do Madrona Advogados na
área de Propriedade Intelectual. “Se não todo mundo teria proteção em todas
as classes.”
As mudanças no registro, afirma ela, são positivas. “A ideia de parâmetros
objetivos traz previsibilidade e isso pode ser muito positivo para as empresas”,
diz Luiza, destacando que a amplitude do reconhecimento em uma pesquisa é
importante, tanto em volume de pessoas quanto na abrangência geográfica.
“Não basta ter um tipo de consumidor, mas diferentes tipos de consumidores
porque falamos de uma proteção nacional.”
Esse é um ponto que dificulta que marcas de luxo cheguem a percentual elevado
de reconhecimento, por serem alvo de cópias e outras tentativas de
aproveitamento de marcas, segundo Rafael Atab, sócio do Dannemann
Siemsen. O advogado destaca que existem marcas muito famosas e se o
consumidor verifica o nome em outro produto vai fazer a associação. “Isso
poderia acarretar em parasitismo dessa fama e, de certa forma, enriquecimento
ilícito de quem a usa”, afirma.
O registro de desenhos e logomarcas também enfrenta mais dificuldade de
reconhecimento, de acordo com Atab. “O alto renome serve para garantir que
o consumidor não seja prejudicado na sua escolha, consumindo um produto
porque acredita ser outro.”
Mas a mudança preocupa, acrescenta o advogado, porque o alto renome precisa
de renovação a cada dez anos e algumas marcas precisarão passar por esse novo
processo. “Prezamos sempre pela segurança jurídica, mas o risco é engessar
muito a necessidade de comprovação do alto renome”, diz ele, em referência
ao texto original com o percentual de 71% e a pesquisa presencial.